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    • “Pretos, velhinhos e doentes: os cães rejeitados na fila da adoção”

    No final de 2024, viralizou nas redes sociais e na mídia impressa o vídeo da fuga em massa de 18 cães da raça Spitz-alemão-anão (lulus-da-pomerânia) em Santa Catarina. Nenhum cãozinho se feriu e eles se limitaram a ir até a esquina da rua sem saída. Mas, a postagem dos vídeos suscitou muito debate por parte de internautas sobre a comercialização de animais.. Ana Claudia Marino comenta.

    • Data :11/01/2025
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    “Pretos, velhinhos e doentes: os cães rejeitados na fila da adoção”

    A matéria publicada pela BBC News Brasil aborda o tema da adoção de cães e traz as “preferências” dos tutores ao procurarem o Centro de Controle de Zoonoses (CCZ) da Prefeitura de São Paulo: filhotes, de pelagem clara ou amarronzada, de pequeno ou médio porte e de personalidade mais amigável.

    A íntegra da matéria pode ser acessada em: https://www.bbc.com/portuguese/brasil-41104389

    O comentário a seguir é de *Ana Claudia Marino:

    Muito embora a matéria tenha sido escrita em 2017, o perfil acima não mudou muito desde então.

    No final de 2024, viralizou nas redes sociais e na mídia impressa o vídeo da fuga em massa de 18 cães da raça Spitz-alemão-anão (lulus-da-pomerânia) em Santa Catarina. Nenhum cãozinho se feriu e eles se limitaram a ir até a esquina da rua sem saída. Mas, a postagem dos vídeos suscitou muito debate por parte de internautas sobre a comercialização de animais.

    Curiosamente, uma pesquisa da Quaest com a PetLove realizada em 2024 traz que 94% dos lares brasileiros têm ou já teve animais de estimação (72% conviviam com um bichinho no momento da entrevista). Metade dos entrevistados informou que adotou seu pet, 28% ganhou de “presente” e 22% comprou o animalzinho.

    A maioria dos pets presentes nos lares brasileiros não tem raça definida (32% dos cachorros e 52% dos gatos). Mais dados da pesquisa podem ser encontrados na matéria https://www.cnnbrasil.com.br/lifestyle/metade-dos-pets-brasileiros-foram-adotados-e-a-maioria-e-vira-lata-diz-pesquisa/ .

    O Instituto H2R a pedido da Comissão de Animais de Companhia (COMAC) revelou em pesquisa realizada em 2020 uma forte tendência dos brasileiros a adotarem seus pets (33% dos pesquisados adotaram um cãozinho e 59% um gatinho). Dentre os tutores que acolheram os cachorros, 17% o encontraram em estado de abandono, 9% foram a feiras de adoção, 5% adotaram de pessoas conhecidas e 2% encontraram o companheiro em ONGs.

    Independente da forma como o pet chega ao tutor, o ponto que deve ser analisado é a intenção que cada tutor traz em seu íntimo e a forma como trata e convive com o bichinho em sua vida.

    Antes de se julgar a preferência dos adotantes, é importante questionar: no momento da adoção ou compra, havia a possibilidade de levar para a casa um animalzinho com algum tipo de deficiência? Se sim, por que não levei?

    Há deficiências que exigem do tutor cuidados e gastos que estão fora de sua condição econômico-financeira. Será que consigo adaptar minha vida e minha casa para atender as necessidades especiais de um pet com deficiência?

    Decidir ter um companheirinho animal em casa exige responsabilidade do tutor, afinal, como nos diz Emmanuel no livro “Alvorada do Reino”, eles são “nossos irmãos menores” 1.

    Antes de prosseguir, compartilho alguns aprendizados pessoais que recebi com os cãezinhos que adotei. Pipoca foi minha primeira experiência com um bichinho de estimação. A adotei ainda filhote (com cerca de 5 meses). Sua mãe havia sido abandonada pela família no antigo imóvel depois da mudança para outro estado. Os vizinhos desciam água e ração por um balde amarrado em uma corda. Ainda assim, a cachorrinha emprenhou e deu à luz 6 filhotinhos. Pipoca foi a única que não foi adotada da ninhada (os vizinhos pediram ajuda a uma clínica veterinária). Um vizinho que ajudou no resgate, nos perguntou se a queríamos e assim, Pipoca chegou até nós e compartilhamos nossa jornada por 17 anos. Sempre muito medrosa e desconfiada, Pipoca tornou-se nossa grande companheira. Sentindo-a solitária, adotamos o filhote de um casal de amigos também sem raça definida. O filhotão chegou aos 50 quilos e com o tamanho de um basset round bem grande. Muito dócil porque vinha de uma adoção muito responsável (os antigos tutores sempre o visitavam), Crunch desencarnou aos 7 anos com câncer. Passado o nosso luto, não nos demos conta que Pipoca também estava vivenciando o luto dela e que estava em depressão. Foi quando a antiga tutora do Crunch nos mandou uma foto de um cachorrinho com carinha de sapeca, todo pretinho e com uma manchinha branca no peito, que tinha sido resgatado por uma ONG. Quando fomos buscá-lo, descobrimos que ele tinha sido atropelado e uma de suas patinhas havia sido mutilada. No momento em que me agachei e perguntei a ele se aceitava ser nosso companheiro, ganhei muitas lambidinhas no pé da orelha! A ONG lhe deu o nome de Ramon (por conta da patinha) e ele tinha 7 meses na época. Pois bem, Ramon andava com dificuldade (não conseguia apoiar a patinha mutilada no chão). Depois de alguns meses brincando com ele de jogar bolinha, percebemos que ele corria pelo nosso quintal com todas as patinhas no chão. Ele se adaptou naturalmente à condição física dele. Hoje, Ramon é um cão sênior (com 8 anos) e já toma suplementos, sobretudo, para o desvio na coluna e para a patinha decorrente da mutilação. Pipoca desencarnou quando Ramon estava com 5 anos, em meio à pandemia. Como já tínhamos uma experiência pregressa com o luto da Pipoca, conseguimos trabalhar o luto do Ramon com muito mais cuidado e atenção. Ano passado, Ramon ganhou uma nova companheira: a Ema.

    Ema, diferente das demais experiências, foi adotada a partir do vídeo postado no Instagram de seu resgate: ela foi abandonada em uma estrada rural, estava vivendo em um lixão, bebendo e comendo somente aos finais de semana quando um ciclista passava por ali e deixava água e ração para ela. Quando assistimos o vídeo, choramos de compaixão por ela. Chegou desnutrida e com problemas renais, mas o principal, com muitas dificuldades de socialização. Ramon, por ser um cão extremamente dócil, se socializou com Ema assim que se conheceram. Mas Ema se mostrava retraída conosco, sempre com medo. Ganhava cafuné de olhinhos fechados com medo de batermos nela. Passados quase 8 meses, ainda há carinhos que evitamos porque, segundo o veterinário, são locais do corpinho dela que devem ter sido muito machucados e que, quando colocamos a mão, ela associa com a dor que teve e grita alto e sofrido.

    Ema, depois de alguns meses, compreendeu que tem um lar e uma família. Agora, estamos no processo de dessensibilização das pessoas que chegam em casa - aos poucos, ela está entendendo que ninguém vai machucá-la aqui, que está em um lugar seguro.

    Compartilho aqui minhas experiências como auxílio para quem está sentindo que chegou o momento de ter um pet em casa: precisamos ter responsabilidade no cuidado e entregar o melhor que está ao nosso alcance para garantir a saúde física e emocional do bichinho que estamos trazendo para o nosso lar. Não é possível achar que ele vai se virar sozinho: os animais são seres sociais.

    O codificador da Doutrina Espírita, Allan Kardec, em “O Livro dos Espíritos” 2, se preocupou em questionar a Espiritualidade Superior acerca dos animais, no Capítulo XI, livro II. As questões 592 a 610 são dedicadas exclusivamente aos animais e sua relação com o homem. A Doutrina Espírita conta com vários livros que abordam a temática, sempre nos recordando, como traz Emmanuel em um livro cujo título leva seu codinome “Emmanuel”: 3 “Os animais têm a sua linguagem, os seus afetos, a sua inteligência rudimentar, com atributos inumeráveis. São eles os irmãos mais próximos do homem, merecendo, por isso a sua proteção e amparo. (…) O sentimento de curiosidade é na maioria deles, altamente avançado e muitas espécies nos demonstram as suas elevadas qualidades, exemplificando o amor conjugal, o sentimento da paternidade, o amparo ao próximo, as faculdades de imitação, o gosto da beleza. Para verificar a existência desses fenômenos basta que se possua um sentimento acurado de observação e de análise. (..) Aves existem que se deixam matar, quando não se lhes permite a defesa das suas famílias. (…) É conhecido o caso dos cavalos de um regimento que mastigavam o feno para um de seus companheiros, mutilizado e enfermo.”

    Diante dos dados colhidos nas pesquisas, observamos o que Emmanuel nos traz nos exemplos acima: em nossa evolução, estamos compreendendo a necessidade da solidariedade para com toda a criação de Deus e, ao mesmo tempo, passamos a aprender um pouco mais sobre a Lei de Amor.

    Pipoca nos ensinou muito, afinal, eu nunca tinha me dedicado a cuidar de um bichinho. Foi minha primeira experiência. Crunch, Ramon e Ema nos ensinaram e ensinam a amar sem condições, sem julgamento, apenas doando de nós, todos os dias, o que temos de melhor. Porque é assim que os animais nos amam: eles, muito diferente de nós, não nos diferenciam por nossa etnia, por nossas deficiências físicas. O que importa a eles é se o respeitamos tal como são, colaborando com sua educação, seu desenvolvimento e sua evolução. Sem humanizá-los e entendendo que são almas que ainda não atingiram a consciência do eu como nos informa a Espiritualidade na questão 598 de “O Livro dos Espíritos” 2.

    Emmanuel, muito poeticamente, nos lembra no já citado livro com seu codinome: “se é impossível o regresso da alma humana ao círculo da irracionalidade, recebei como obrigação sagrada o dever de amparar os animais na escala progressiva de suas posições variadas no planeta. Estendei até eles a vossa concepção de solidariedade e o vosso coração compreenderá, mais profundamente, os grandes segredos da evolução, entendendo os maravilhosos e doces mistérios da vida.” 3

    *Ana Claudia Marino é espírita e colaboradora do Espiritismo.Net


    1. XAVIER, Francisco Cândido. Alvorada do Reino. Espírito Emmanuel. 1º ed. Editoras FEB/IDEAL, 2023. ↩︎

    2. KARDEC, Allan. O Livro dos Espíritos. 4º edição. Brasília: FEB, 2019. ↩︎ ↩︎

    3. XAVIER, Francisco Cândido. Emmanuel. Espírito Emmanuel. 28º ed. Brasília: FEB, 2018. ↩︎ ↩︎