Sentimos necessidade de elaborar uma 2ª versão do controvertido tema homossexualidade em função de ainda identificar nas hostes espíritas intolerância e preconceitos sobre o assunto, cuja 1ª versão editada em 21/04/2006 pode-se ler clicando aqui .
As múltiplas experiências humanas pela reencarnação e os repetidos contatos com ambos os sexos proporcionam ao espírito as tendências sexuais na feminilidade ou masculinidade e este reencarna com ambas as polaridades e se junge, às vezes, contrariado aos impositivos da anatomia genital e ao da educação sexual que acolhe em seu ambiente cultural. Consoante essas experiências tenderá para qualquer das duas opções e o fará nem sempre de acordo com sua aspiração interior, que poderá ser inversa ao que determina o meio socio-cultural.
Emmanuel ensina na obra “Vida e Sexo” que o “Espírito passa por fileira imensa de reencarnações, ora em posição de feminilidade, ora em condições de masculinidade, o que sedimenta o fenômeno da bissexualidade, mais ou menos pronunciado, em quase todas as criaturas."(1) Talvez ocorram fatores educacionais que possam contribuir para despertar no indivíduo as tendências sepultadas nas profundezas de seu inconsciente espiritual. E, ainda que desempenhe papéis de acordo com a sua anatomia genital, e que seu psiquismo se constitua de acordo com sua opção sexual, poderá ocorrer que se desperte com desejos de ter experiências com pessoas do mesmo sexo.
Sobre essa perspectiva, há também estudiosos que atestam a não interferência educacional para quaisquer das homossexualidades(2), de acordo com o consenso dos estudos psicológicos atuais, até porque o cerco em volta de todo o processo educacional é hetero, sustentam.
Afirma-se, ainda, que o homossexual, quando desempenha papel heterossexual é sempre em função de conflitos provocados pelo meio social, no que não alcança realização e habitualmente recorre a fantasias homossexuais para alcançar efeitos heterossexuais. Quando há realização tanto homo quanto hetero, então aí estaremos diante da bissexualidade manifesta.
Em que pese o apontamento da Psicologia para a positivação da identidade bissexual, pode ocorrer (não necessariamente, que na realidade a pessoa seja um homossexual tentando uma vivência dupla em função de algum fator de conflito). Tal ocorrência poderá lhe tumultuar a consciência caracterizando, por aquele motivo, um transtorno psíquico-emocional, embora os transtornos nunca serão em função da homossexualidade em si, mas da ação dos preconceitos sofridos pelo indíviduo.
A convivência do espírito com o sexo oposto ao que adotou em cada encarnação, bem como aquelas em que exerceu sua opção sexual, irão plasmar em seu psiquismo as tendências típicas de cada polaridade. Sabemos também existir estudiosos sinceros explicando que a expressão opção sexual está abandonada pela Psicologia, desde que a ocorrência é sempre de tendência manifesta, desta forma o meio em volta em nada colabora para a existência de opção. Afirma-se ainda que admitir opção para homossexualidade seria também admitir um enorme masoquismo, diante de toda a adversidade que cerca o indivíduo em relação à homossexualidade.
Explica Emmanuel: “A homossexualidade, também hoje chamada transexualidade, em alguns círculos de ciência, definindo-se, no conjunto de suas características, por tendência da criatura para a comunhão afetiva com uma outra criatura do mesmo sexo, não encontra explicação fundamental nos estudos psicológicos que tratam do assunto em bases materialistas, mas é perfeitamente compreensível à luz da reencarnação."(3)
Na questão 202 de O Livro dos Espíritos, Allan Kardec indaga aos Espíritos: “Quando errante, que prefere o Espírito: encarnar no corpo de um homem, ou no de uma mulher?” “Isso pouco lhe importa”, responderam os Benfeitores. “O que o guia na escolha são as provas por que haja de passar”(4), esclareceram os Espíritos.
A genética tem tentado encontrar genes que explicariam a homossexualidade como sendo desvio de comportamento sexual. A psiquiatria tentou encontrar enzimas cerebrais que poderiam influenciar no comportamento sexual. Alguns sexólogos, explicam que é uma preferência sexual (lembrando aqui que oficialmente a expressão opção foi abolida). Mas a sede real do sexo não se acha no veículo físico, porém na estrutura complexa do espírito. É por esse prisma que devemos encarar as questões relacionadas ao sexo. “A coletividade humana aprenderá, gradativamente, a compreender que os conceitos de normalidade e de anormalidade deixam a desejar quando se trate simplesmente de sinais morfológicos”.(5)
Não podemos confundir homossexualidade com desvio de caráter, até porque os deslizes sexuais de qualquer tendência têm procedências diversas. Suas raízes genésicas podem vir de profundidades íntimas insondáveis. “A própria filogênese(6) do sexo, que começa aparentemente no reino mineral, passando pelo vegetal e ao animal, para depois chegar ao homem, apresenta enorme variação de formas, inclusive a autogênese [geração espontânea] dos vírus e das células e a bissexualidade dos hermafroditas”(7), o que para alguns pesquisadores justificaria o aparecimento do que seriam desvios sexuais congênitos. Especialistas dizem também que atualmente, o conceito de desvio mudou muito, e um homossexual que se force à heterossexualidade seria tido como um desvio.
Com a liberação sexual e a ascensão do feminino na sociedade contemporânea, a tolerância à homossexualidade aumentou, permitindo que uma grande quantidade de pessoas que viviam no anonimato se expressasse naturalmente, graças a luta dos homossexuais por seus direitos em todo o mundo, inclusive forçando a mudança de legislações. Chico Xavier explica, de forma clara, o seguinte: “Não vejo pessoalmente qualquer motivo para críticas destrutivas e sarcasmos incompreensíveis para com nossos irmãos e irmãs portadores de tendências homossexuais, a nosso ver, claramente iguais às tendências heterossexuais que assinalam a maioria das criaturas humanas. Em minhas noções de dignidade do espírito, não consigo entender porque razão esse ou aquele preconceito social impediria certo numero de pessoas de trabalhar e de serem úteis à vida comunitária, unicamente pelo fato de haverem trazido do berço características psicológicas e fisiológicas diferentes da maioria. (…) Nunca vi mães e pais, conscientes da elevada missão que a Divina Providência lhes delega, desprezarem um filho porque haja nascido cego ou mutilado. Seria humana e justa nossa conduta em padrões de menosprezo e desconsideração, perante nossos irmãos que nascem com dificuldades psicológicas?"(8) Creio ser importante lembrar aqui que as dificuldades psicológicas são em decorrência de conflitos pelo preconceito. Vencido o preconceito, pelo próprio indivíduo, cessa o conflito psicológico. É claro que seria pedir demais que o Chico fosse a isso em suas declarações, mesmo porque pela época da entrevista, da forma como ele colocou já foi efetivamente uma atitude de muita autencidade e coragem diante da verdade.
A Doutrina Espírita é libertadora por excelência. Ela não tem o caráter tacanho de impor seus postulados às criaturas, tornando-as infelizes e deprimidas. A energia sexual pede equilíbrio no uso e não abuso ou repressão. A Doutrina Espírita não condena a homossexualidade, contrariamente, recomenda-nos o respeito e fraterna compreensão para com os que têm preferências homoafetivas. Muitas vezes, pode até ser alguém tangido pelo apelo permissivo que explode das águas tóxicas do exacerbado erotismo, somado aos diversos incentivadores pseudocientíficos da depravação, que podem estar desestruturando seu sincero projeto de edificação moral, através de uma conduta sexual equilibrada.(9) Por isso mesmo, não pode ser discriminado nem rejeitado, pois a mensagem de Jesus é a do “amar o próximo como a si mesmo."(10)
Como já vimos com Emmanuel no início desta exposição, não há masculinidade plena, nem plena feminilidade na Terra. Tanto a mulher tem algo de viril, quanto o homem de feminil. Antigamente, a educação muito rígida e repressiva contribuía para enquadrar o indivíduo homossexual de acordo com a expectatativa social em volta, contrariando suas tendências espontâneas.
Assumir a homossexualidade não significa mergulhar em um universo de atitudes extremadas e desafiadoras perante seu grupo de relacionamento familiar ou profissional, “mas fazer um profundo exercício de auto-aceitação, asserenar-se por dentro, a fim de poder reconhecer perante si mesmo e todo seu círculo de amigos e parentes que vives uma situação de desafio. O verdadeiro desafio é a construção interna para orientar saudável e equilibradamente os desejos. E não estamos aqui referindo-nos exclusivamente a desejo sexual e sim a toda espécie de desejos que comandam a vida das criaturas."(11)
Emmanuel enfatiza que: “O mundo vê, na atualidade, em todos os países, extensas comunidades de irmãos em experiência dessa espécie [homossexual], somando milhões de homens e mulheres, solicitando atenção e respeito, em pé de igualdade devidos às criaturas heterossexuais."(12) A homossexualidade não deve, pois, ser classificada como uma psicopatia ou comportamento merecedor de discriminação ou medidas repressivas. O homossexual, especialmente o transsexual, merece toda a nossa compreensão e ajuda, para que ele possa vencer sua luta de adaptação à identidade de agora ou ao novo sexo adquirido com o renascimento.
Outra questão extremamente controvertida, para muitos cristãos, é a possibilidade da união estável [casamento] entre duas pessoas do mesmo sexo. Ante a miopia preconceituosa do falso purismo religioso da esmagadora maioria de cristãos supostamente “puros”, isso é uma blasfêmia. Isto torna o tema bastante complexo, e não ousaríamos opinar com a palavra definitiva. [estamos abertos a discussões] Porém, após refletir bastante sobre o assunto e, sobretudo, tendo como alicerce as opiniões de Chico Xavier, entendemos que a união estável [casamento] entre homossexuais pode ser legítima, até porque cada um deve saber de si o que melhor norteia sua própria felicidade. Só conseguiremos entender melhor a questão homossexual depois que estivermos livres dos (pré)conceitos que nos acompanham há muitos milênios. Arriscaríamos afirmar que a legalização do casamento entre duas pessoas do mesmo sexo é um avanço da sociedade, que estará apenas regulamentando o que de fato já existe.
Tanto o homossexual como o heterossexual devem buscar a sua reforma interior, não cedendo aos arrastamentos provocados pelos impulsos instintivos e sensuais. Lembremos, o que é ilícito ao hétero, também o é ao homossexual. Ambos precisam “distinguir no sexo a sede de energias superiores que o Criador concede à criatura para equilibrar-lhe as atividades, sentindo-se no dever de resguardá-las contra os desvios suscetíveis de corrompê-las. O sexo é uma fonte de bênçãos renovadoras do corpo e da alma”(13)
Mister, portanto, reconhecer que ao serem identificados os pendores homossexuais das pessoas nessa dimensão de experiência é imperioso se lhes oferte o amparo educativo pertinente, nas mesmas condições que se administra instrução à maioria heterossexual da sociedade.
Acreditamos, por fim, que estas idéias poderão levar, a quantos as lerem, a meditar, em definitivo, sobre o assunto, lembrando que a homossexualidade transcende em si mesmo à simples questão da permuta sexual.
24/11/2007
Fontes:
(1) Xavier, Francisco Cândido. Vida e Sexo, Ditado pelo Espírito Emmanuel, Rio de Janeiro: Ed FEB, 2001;
(2) A Ciência já encontrou a homossexualidade nas diversas espécies pesquisadas em seus habitats, excluindo as hipóteses de cativeiro ou interferências outras. Até nos insetos há homossexualidade. Isso mostra que a homossexualidade é uma manifestação como qualquer outra da Natureza, ou mais propriamente falando: faz parte da obra de Deus;
(3) Xavier, Francisco Cândido. Vida e Sexo, Ditado pelo Espírito Emmanuel, Rio de Janeiro: Ed FEB, 2001;
(4) Kardec, Allan. O Livro dos Espíritos, Rio de Janeiro: Ed. Feb, 2000, perg. 202;
(5) Xavier, Francisco Cândido. Vida e Sexo, Ditado pelo Espírito Emmanuel, Rio de Janeiro: Ed FEB, 2001;
(6) Filogenia (história evolucionária das espécies) opõe-se à ontogenia (desenvolvimento do indivíduo desde a fecundação até a maturidade para a reprodução);
(7) Disponível em acessado em 21/04/2006;
(8) Publicada no Jornal Folha Espírita do mês de março de 1984;
(9) A recomendação do Espiritismo para o respeito e a compreensão para com os irmãos que transitam em condições sexuais inversivas (homossexualismo) ocorre em função do sentimento de fraternidade ou caridade que deve presidir o relacionamento humano, mas igualmente pelo fato de que nenhum de nós tem autoridade suficiente para condenar quem quer que seja, pois todos temos dificuldades morais e/ou materiais graves que precisam de educação.
(10) João, cap. VIII, vv. 3 a 11;
(11) Disponível em acessado em 21/04/2006;
(12) Xavier, Francisco Cândido. Vida e Sexo, Ditado pelo Espírito Emmanuel, Rio de Janeiro: Ed FEB, 2001;
(13) Xavier, Francisco Cândido. Conduta Espírita, Ditado pelo Espírito André Luiz, Rio de Janeiro: Ed FEB, 2001.