“Sem dúvida, a pessoa portadora de substâncias fragmentadoras move-se em um verdadeiro nevoeiro, que é mais compacto ou mais sutil, conforme as fixações, os vícios a que se aferra.”
“Identificando-se com as ideias que lhe são convenientes — algumas de procedência psicopatológica — adapta-se-lhes e incorpora-as, deformando a personalidade, e esta irrealidade termina por afetar-lhe a individualidade, caso não se resolva pela psicoterapia específica e urgente. “
Espíritos compatíveis com um mundo de expiação e provas tem como característica principal despender energia com os seus interesses pessoais, focando sua existência em suprir seus desejos. Portanto, atenção se faz necessária para este comportamento doentio em que todos, uns mais outros menos, buscam e prestam atenção apenas nas ideias que lhe são convenientes.
Para o espírita sincero este alerta de Joanna de Ângelis deve ser motivo para grande atenção, especialmente em se tratando de assuntos espíritas que primam pela transformação pessoal. Muitas vezes, para não dizer na maioria das vezes, os assuntos relacionados ao comportamento adequado e sadio, mas que são contrários aos nossos interesses, são entendidos de uma forma deturpada para amenizar o chamamento para a responsabilidade, isto é, interpreta-se a informação como melhor aprouver.
Com relação ao seguinte termo utilizado por Joanna de Ângelis: “algumas de procedência psicopatológica”, pode-se dizer que a grande questão que o espírito encarnado na Terra se vê a braços é o fato de apresentar algum nível de psicopatologia. Isto é decorrente de, como demonstrado anteriormente, o espírito se ater principalmente voltado para os seus interesses pessoais, evitando conhecer e avaliar outras possibilidades para sua experiência carnal, numa tentativa grotesca de se furtar das adversidades.
As encarnações não devem ser consideradas como um “passeio no parque”, momentos de descanso em que o espírito gozará das benesses de um deus. Muitas vertentes religiosas pregam uma divindade cujo atributo principal é evitar as dificuldades, devendo o fiel, para isso, cumprir certas obrigações. Pensamentos deste tipo datam de longa data, indicando o sacrifício animal, inclusive o humano, para apascentar a divindade e garantir uma colheita produtiva.
As adversidades precisam ser trabalhadas e, assim, o espírito poderá exercitar o raciocínio e, com isso, o entendimento da vida. Buscando as soluções, exercita, também, a faculdade de considerar várias opções disponíveis até que, ao cabo de algum tempo, terá condições, inclusive, de criar soluções até então desconhecidas. A ciência humana avança de forma semelhante, o cientista buscando encontrar o entendimento daquilo que observa, elabora teorias que melhor descrevem o fenômeno. Estas teorias vão sendo melhor elaboradas conforme o aprofundamento do entendimento.
Assim, as adversidades ajudarão o indivíduo a distinguir a identificar em si mesmo o comportamento que causa ou é decorrente de uma psicopatologia. Em se mantendo na zona de conforto, isto é, nas experiências que saciam os interesses pessoais limitados a matéria, o comportamento patológico não será identificado como tal, seja por não encontrar campo para se manifestar ou por ser considerado como sendo normal para o meio social em que se encontra e faz parte.
Se mantendo apenas no que lhe é conveniente, portanto, dentro de um conjunto limitado, sendo que alguns desses “convenientes” são de natureza psicopatológicas, são incorporados pelo indivíduo e, consequentemente, o conteúdo psíquico produzido será a sua expressão pessoal. Neste contexto, a personalidade pagará um alto preço por sofrer as deformações decorrentes da assimilação deste tipo de ideia.
Algumas substâncias, tais como o tabaco e álcool, podem causar dependência naqueles que estão mais suscetíveis, a informação constante e direta sobre um tema qualquer que vai de encontro com os anseios do indivíduo suscetível será incorporada e considerada como verdade, não mais questionada, passando a ser a sua “filosofia de vida”. Em decorrência disto, muita atenção é necessária nomovimento espírita, pois, como existe a tendência da religiosidade fanática, que em termos espíritas seria a fé não raciocinada, interpretações equivocadas ou deturpadas podem ser propagadas continuamente e não mais analisadas.
Todo aquele que se diz espírita necessita se manter à Codificação Kardequiana como referência primordial e toda informação deve ser confrontada para correta avaliação.
“Expressam-se essas identificações nas áreas fisiológicas — como sensações — e psicológica — como emoções.”
“Toda vez que a pessoa tenta a conscientização íntima, o encontro com o Eu profundo, a busca interior, as sensações predominantes nas paisagens físicas perturbam-lhe a decisão, impedindo a experiência. São sensações visuais, gustativas, olfativas, auditivas, tácteis, com as quais convive em regime de escravidão, e que assomam no silêncio, na concentração, ocupando o espaço mental, desviando a atenção da meta que busca.”
O estabelecimento de determinado padrão de comportamento faz com que o corpo físico, que responde ao pensamento por natureza, tenda a se adequar e responder em regime de simbiose. Contudo, padrão mental enfermiço forçosamente conduzirá a estados também enfermiços para o corpo.
Em decorrência deste processo, em momentos de lucidez, o indivíduo vislumbra que outro padrão mental e, consequentemente, de comportamento, poderá restabelecer a saúde tanto física quanto mental. Todavia, tal como o viciado sofre de abstenção, mesmo quando seu desejo é da liberação do vício, o espírito que se manteve renitente durante largo período de tempo, o próprio corpo físico se contrapõe, devido ao condicionamento, a qualquer tentativa de alteração do quadro instalado. Isto ocorre pelo motivo do corpo, que é matéria e, também, plástico, isto é, amoldável, é uma expressão do pensamento.
Esta relação mente-corpo pode ser observada na prática de exercícios físicos, mais especificamente na retomada após longo período de inatividade. No início, o corpo se ressente do movimento diferente e mais contundente do que o costumeiro, respondendo com dificuldade para realizar os movimentos e, também, surgem as dores musculares. Porém, com a continuidade do esforço, em determinado momento, o corpo acaba por ceder ao comando. Podemos interpretar este comportamento como a necessidade de que primeiramente haja a adequação mental para que o corpo responda adequadamente num processo repetitivo e constante.
O corpo, sendo matéria, apresenta uma plasticidade relativa, responde com uma postura condizente com a mente. A certeza inicial de que não se consegue realizar um movimento, por exemplo, congela o corpo; passando da certeza da incapacidade para a dúvida libera o corpo das tensão congelantes, apesar de ainda não ser capaz; contudo, ao acreditar na capacidade libera o corpo de todas as tensões e, então, o processo flui. Esta premissa também seria válida para a manutenção da saúde física.
A mente preparada para alçar vôos mais altos não se mantém escrava das sensações físicas, assim, estas sensações deixam de ser o interesse precípuo do indivíduo deixando, portanto, de funcionarem como “âncora” que fixam o ser espiritual numa determinada condição.
“São ruídos externos que, em outras circunstâncias, não são percebidos; imagens visuais arquivadas, aparentemente esquecidas; olfação excitada, que provoca o apetite; coceiras e comichões que surgem, simultâneos, em várias partes do corpo; salivação e desejo de alimentar-se, tomando os centros de interesse e desviando-os da finalidade libertadora.”
“Por outro lado, nos tentames do silêncio interior para reequilíbrio da personalidade, as sensações produzem associações de idéias que levam a evocações insensatas.”
“Música e perfume retornam à sensibilidade orgânica e induzem a recordações atribuladoras, com lamentáveis anseios de repeti-las e frui-las novamente.”
“A mente viciada e o corpo acomodado dificultam o despertar da consciência para a lucidez.”
Assim, todas as vezes, para o indivíduo aferrado em seus interesses pessoais, que busca atividades ou interesses de elevação, o espírito perceberá o “peso da âncora”, isto é, o corpo, ainda sob os efeitos das viciações prolongadas, se ressentirá do novo comportamento, necessitando das doses de fluidos perniciosos com os quais está acostumado. Contudo, o esforço constante e disciplinado fará com que,gradativamente, a “âncora” fique cada vez mais leve, isto é, a urgência de satisfação do corpo cede, gradativamente, lugar a interesses outros de natureza espiritual.
É uma ilusão acreditar que exista a libertação imediata dos condicionamento que mantém o ser prisioneiro de suas viciações pela simples vontade. Porém, é preciso estar ciente se tratar de um processo de libertação no qual o indivíduo vai, gradativamente, liberando as amarras, primeiramente mais fracamente ligadas que, com isso, enfraquece as ligações mais fortes que, por sua vez, passam a ser mais fracas e mais fáceis de serem quebradas.
O importante, portanto, é o processo, pois, uma vez iniciado, a vida vai ficando mais fácil e os percalços e contrariedades molestando menos.
Contudo, para haver resultado é preciso primeiramente acreditar que se trata de seu desejo, para depois querer realmente e, finalmente conseguir. Uma dificuldade inicial reside no fato de não se distinguir entre acreditar se tratar de um desejo pessoal e querer realmente. Por isso, muitas vezes espera-se um resultado muito cedo no processo e, como não alcança o intento, desanima e cessa o esforço. 26 de Outubro de 2015