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Quando estava na faculdade nos Estados Unidos, Jackson Katz fazia parte do time de futebol americano. Foi lá que ele aprendeu que um ‘homem de verdade’ precisava ser ‘forte’, ‘durão’ e ‘macho’. Jorge Hessen comenta.

  • Data :27/02/2016
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28 de fevereiro de 2016

‘Precisamos que mais homens apoiem feminismo’, diz americano que dá treinamento antimachismo

Renata Mendonça - @renata_mendonca Da BBC Brasil em São Paulo

Quando estava na faculdade nos Estados Unidos, Jackson Katz fazia parte do time de futebol americano. Foi lá que ele aprendeu que um “homem de verdade” precisava ser “forte”, “durão” e “macho”.

Mas por não concordar com esse pensamento – e por entender que o número crescente de casos de abuso e violência sexual contra mulheres nas universidades americanas estava diretamente ligado a ele -, Katz decidiu formar um grupo de homens universitários para combater essa cultura. E o nome escolhido para o grupo foi exatamente “Homem de Verdade”.

Os anos se passaram e, depois de formado, Katz foi se aprofundando nos estudos sobre essa questão até criar um treinamento para combater o machismo e a violência contra a mulher no ambiente universitário.

Foi assim que surgiu, em 1993, o “MVP” – Mentors in Violence Prevention (Mentores na Prevenção da Violência, na tradução livre) -, programa aplicado em equipes esportivas e instituições universitárias para ensinar os homens a serem lideres proativos contra o sexismo.

O programa - que hoje tem como público-alvo tanto homens quanto mulheres - fez sucesso e já foi expandido para outras instituições universitárias e até para forças armadas de Estados Unidos, Alemanha, Iraque e Japão, entre outros.

O método do treinamento é focado em dois objetivos: primeiro em conscientizar as pessoas sobre os males do sexismo, depois em inspirar uma mudança de comportamento delas baseada na “abordagem do espectador”.

“Temos que mudar a socialização dos homens, mudar o conceito de masculinidade. O fato de homens serem educados para serem dominantes sobre as mulheres, para serem abusivos na hora de conseguir o que querem, e de isso ser aceitável. Se mudarmos a maneira como educamos e socializamos esses garotos, então a maioria da violência contra a mulher vai desaparecer”, explicou Jackson Katz à BBC Brasil.

“Quero que pensem em uma mulher que vocês amam. Imaginem que ela está subindo as escadas ou em uma boate ou mesmo andando na rua, e um cara começa a mexer com ela. Ele fala coisas desrespeitosas, todos os tipos de abusos verbais. E talvez esse cara decida colocar as mãos nela, atacá-la fisicamente. Ele vai além, abusa sexualmente dela. Agora imaginem uma terceira pessoa ali vendo tudo isso. Mas ela só olha e não faz nada a respeito”.

Foi dessa forma que os mentores do programa se aproximaram de atletas de equipes universitárias de beisebol, futebol americano e basquete para ensiná-los sobre o papel e a responsabilidade que têm ao presenciarem situações de machismo ou abuso.

“Existe um ditado que diz ‘aquele que vê uma situação de opressão e não faz nada está assumindo o lado do opressor’. Se há uma situação de abuso na sua frente e você não faz nada, você está consentindo”, disse.

Katz ressalta que é preciso tomar cuidado quando as situações envolverem desconhecidos, mas reforça: “Se eu estou em uma festa e vejo meu amigo abordando uma mulher de uma maneira invasiva, abusiva, eu preciso pará-lo e dizer que ele está errado. Se eu escolho não fazer nada, eu estou dando meu consentimento para aquele comportamento abusivo.”

Cultura machista

Um dos homens pioneiros na luta pela igualdade de gênero, Katz começou o ativismo para combater a “cultura machista” ainda na década de 1980 e hoje coleciona inúmeras palestras em mais de 30 países - incluindo sua fala no TED, conferência de projetos e ideias inovadoras, que já teve mais de 1,2 milhão de visualizações.

Em visita ao Brasil em dezembro para participar do Fórum “Fale sem medo” organizado pelo Instituto Avon, ele falou à BBC Brasil sobre a importância de ampliar o debate sobre “questões de gênero” também para os homens.

“Quando falamos em gênero, muita gente já associa essa palavra diretamente à mulher. Mas homem também é gênero. E a cultura machista também é prejudicial a ele. O mesmo sistema que produz homens que abusam de mulheres, produz homens que abusam de outros homens”, afirmou em entrevista à BBC Brasil.

“Nós sempre combatemos esse problema ensinando as mulheres a se protegerem, como se vestirem, o que devem evitar. Mas precisamos de novas formas de pensar isso. A questão não é ensinar as mulheres a se protegerem. É acabar com a cultura que ensina os homens a abusá-las”, completou.

Para conseguir essa mudança de cultura, Katz defende a importância de mais homens se juntarem à causa.

“As mulheres são protagonistas e a liderança delas tem sido transformadora. É a base de tudo. Mas é preciso pensar que os homens ainda detêm o poder político, econômico e social no mundo”, disse.

“O meu trabalho é pensar em como eu, como homem, posso usar o acesso que tenho a instituições políticas, sociais e econômicas, para, trabalhando em parceria com mulheres, mudar essa realidade. E precisamos de mais homens que pensem da mesma forma.”

Democracia e feminismo

Jackson Katz começou a se interessar pelo tema da igualdade de gênero ao observar o cuidado que suas vizinhas na Universidade tinham para sair na rua ou ir a festas.

Enquanto ele andava tranquilamente de um lugar para o outro, sem se importar com nada, elas estavam constantemente em alerta, preocupadas com a segurança pessoal, com medo de serem abusadas ou estupradas.

Mas mais do que empatia, Katz diz que se juntou à causa do feminismo por uma “conscientização política”.

“Eu entendo que existe uma subordinação da mulher, que é uma questão política, baseada em uma estrutura social, política e econômica. E, como homem e como cidadão responsável, eu quero fazer algo para mudar esse sistema de desigualdade.”

“Eu costumo dizer para os homens nos meus treinamentos e palestras: se você acredita em democracia, você acredita em justiça, em igualdade e, consequentemente, em feminismo, ponto final. Então se você se diz a favor da democracia, mas não é a favor do feminismo, ou você não entende o que é feminismo, ou você não entende o que é democracia.”

Notícia publicada na BBC Brasil , em 25 de janeiro de 2016.

Jorge Hessen comenta*

Jackson Katz, mestre em educação pela Universidade Harvard e doutor em estudos culturais pela Universidade da Califórnia, foi um dos criadores, em 1993, do Mentors in Violence Prevention, um programa de prevenção contra o assédio e o abuso sexual nos Estados Unidos. Se dedica praticamente todo o seu tempo a combater a violência contra a mulher e a promover a igualdade entre os gêneros. O método do treinamento Katz é focado nalguns objetivos, dentre eles conscientizar as pessoas sobre os males do sexismo mudar o conceito de masculinidade. O fato de homens serem educados para serem dominantes sobre as mulheres, para serem abusivos na hora de conseguir o que querem é inaceitável. Urge mudança dos métodos de educação e socialização dos meninos para que no amanhã a violência contra a mulher desapareça.

Antecipando-se no tempo, Allan Kardec já protegia a mulher contra os desvarios de sua época. Teve a cautela de deixá-las envoltas em uma capa de semi-anonimato, pois o preconceito contra elas ainda era colossal. Basta notar que 129 operárias americanas foram queimadas vivas dentro de uma fábrica pelo “crime” de reivindicarem salários iguais aos dos homens, e o fato ocorreu a apenas 41 dias do lançamento de O Livro dos Espíritos . E, além de mulheres, as médiuns estudadas por Kardec ainda eram jovens e paranormais (bruxas?). Um “banquete” para a mentalidade vitoriana do século XIX.

Na França do fim do século XIX, a imprensa parisiense se agitava em um debate em torno da legalidade de diplomar ou não uma jovem bacharela de 20 anos que acabara de se graduar academicamente, tão-somente por causa da sua condição feminina. O Codificador explana o fato: “Depois de terem reconhecido que ela [a mulher] tinha alma, lhe reconheceram o direito à conquista dos graus de ciência, o que já é alguma coisa. E afirma que os direitos das mulheres não são concessões dos homens, como atestavam alguns intelectuais, mas resultado da própria Natureza, que não fez nenhum superior ao outro. É com o mesmo objetivo que os Espíritos se encarnam nos sexos diferentes: aquele que foi homem poderá renascer mulher e vice-versa, a fim de realizar os deveres de cada uma dessas posições e sofrer-lhe as provas necessárias ao progresso.”(1)

Na questão 817 de O Livro dos Espíritos , os Benfeitores atestam que “Deus outorgou a ambos [homem e mulher] a inteligência do bem e do mal e a faculdade de progredir, sendo esse o maior sinal da igualdade entre ambos”.(2) Não existe, portanto, diferenças entre o homem e a mulher senão no organismo material (que se extingue com a morte), dando por lei natural a igualdade de direitos, mas com funções diferentes, apropriadas às características intrínsecas de cada sexo.

Noutro lado do debate, observamos com pesar o movimento feminista, onde a mulher moderna, de modo geral, indiferente aos seus deveres de mulher, embrenham-se nas ilusões políticas, na concorrência profissional, nas peçonhas filosóficas que invadiram os seus ideais. Não são muitas as mulheres que se mantêm com humildade, nos postos de serviço com Jesus, convictas da transitoriedade das posições humanas. “A ideologia feminista dos tempos modernos, com as diversas bandeiras políticas e sociais, pode ser um veneno para a mulher desavisada dos seus grandes deveres espirituais na face da Terra. Se existe um feminismo legítimo, esse deve ser o da reeducação da mulher para o lar, nunca para uma ação contraproducente fora dele. É que os problemas femininos não poderão ser solucionados pelos códigos do homem, mas somente à luz generosa e divina do Evangelho.”(3)

A “era tecnológica pretende, na essência, construir uma civilização sem as mães e isso é um erro muito grande, de modo que, criando dificuldades para a mulher e, especialmente, para a maternidade, estamos condenando a nós mesmos a muitas perturbações, porque a mulher sem apoio entra, naturalmente, em desespero, dando origem a determinadas teorias que não são aquelas do feminismo autêntico, aquele feminismo correto que prepara a mulher para a independência construtiva”.(4)

A mulher deve reduzir, o quanto lhe for possível, o tempo gasto no trabalho profissional e se esforçar mais na tarefa da educação de seus filhos, preferindo ganhar um pouco menos em valores materiais e potencializar seus tesouros espirituais. Sabemos que atualmente não está fácil essa tarefa, pois a sociedade se curvou ante o consumismo, a concorrência profissional, sequestrando a mulher do lar para enclausurá-la nas funções hodiernas às vezes subalternas a sua grandeza e quase sempre estranhas à sua natureza.

No entanto, no desafio que se impõe à mulher, pensamos que é sua principal missão sensibilizar o mundo com uma atuação profissional mais humana, menos burocrática e mais efetiva em favor do semelhante, sem, porém, nunca esquecer a ternura do lar, invertendo os valores legítimos da alma. A mulher deve conciliar o papel de mãe e esposa, muitas vezes deixado para segundo plano.

“Homem e mulher são iguais perante Deus e têm os mesmos direitos porque a ambos foi outorgada a inteligência do bem e do mal e a faculdade de progredir."(5) Não existem sexos opostos, mas complementares. “O homem e a mulher, no instituto conjugal, são como o cérebro e o coração do organismo doméstico. Ambos são portadores de uma responsabilidade igual no sagrado colégio da família; e, se a alma feminina sempre apresentou um coeficiente mais avançado de espiritualidade na vida, é que, desde cedo, o espírito masculino intoxicou as fontes da sua liberdade, através de todos os abusos, prejudicando a sua posição moral no decurso das existências numerosas, em múltiplas experiências seculares.”(6)

Referências bibliográficas:

(1) Kardec, Allan. Revista Espírita, janeiro de 1866, RJ: Ed. FEB;

(2) Kardec, Allan. O Livro dos Espíritos, perg. 817 e seguintes, 9a. ed. de bolso. RJ: Ed. FEB, 2005;

(3) Xavier, Francisco Cândido. O Consolador, perg. 67, RJ: Ed. FEB, 2000;

(4) Xavier, Francisco Cândido. A Terra e o Semeador, ditado pelo Espírito Emmanuel, SP: Ed. Ideal, 1975;

(5) Kardec, Allan. O Livro dos Espíritos, perg. 817 e seguintes, 9a. ed. de bolso. RJ: Ed. FEB, 2005;

(6) Xavier, Francisco Cândido. O Consolador, perg. 67, RJ: Ed. FEB, 2000.

  • Jorge Hessen é natural do Rio de Janeiro, nascido em 18/08/1951. Servidor público federal aposentado do INMETRO. Licenciado em Estudos Sociais e Bacharel em História. Escritor (dois livros publicados), Jornalista e Articulista com vários artigos publicados.