25 de setembro de 2015
‘Templo Satânico’apresenta escultura de ídolo pagão e gera polêmica nos EUA
O corpo é de um homem musculoso, cabeça e patas de um bode com barba e chifres, tem grandes asas, exibe um pentagrama na testa e o que parece com um bastão de Esculápio à frente do abdome, um antigo símbolo associado ao deus grego de mesmo nome e à Medicina. Esta é uma estátua do ídolo pagão Baphomet (ou Bafomé) que o grupo religioso Templo Satânico inaugurou em Detroit, nos Estados Unidos. Além de todos estes símbolos e representações, a estátua também aponta dois dedos para o céu e está cercada por um menino e uma menina. No website dos organizadores do evento, a inauguração da estátua - ocorrida no último sábado - foi anunciada como uma “noite de caos, ruído e libertinagem” onde apenas maiores de 18 anos poderiam entrar. “Venha dançar com o diabo e viver a História enquanto ela é escrita”, continuava o convite. A escultura apresentada pelo Templo Satânico é de bronze e pesa uma tonelada e meia. Tem 2,59 metros de altura e foi inaugurada em um edifício industrial perto do rio Detroit, pouco antes das 11h30 da noite. O local exato da inauguração só foi informado para os participantes por email poucas horas antes do evento e a estátua não pôde ser vista pelo público em geral. Os organizadores afirmam que apresentaram a estátua desta forma, em segredo, para “reduzir a perseguição”, de acordo com declaração de um dos fundadores da organização, Lucien Greaves. Por perseguição, Greaves se referia a cerca de 50 pessoas que protestaram do lado de fora do restaurante no qual, inicialmente, o Templo Satânico pretendia mostrar a estátua pela primeira vez. Mas, o plano teve que ser cancelado pois o dono do restaurante, Bert Dearing, desistiu de realizar o evento. “Detroit é uma área muito religiosa. Quando aluguei este lugar acreditei que se tratava de uma igreja. Não sabia da apresentação da estátua. Não sabíamos que eram adoradores do diabo”, disse Dearing. Dearing também mandou celebrar missas contra Baphomet, como a celebrada no sábado em uma das igrejas católicas da cidade, a de Saint Joseph, a mais popular do Estado americano de Michigan. “A última coisa que precisamos em Detroit é de uma festa de boas vindas para o diabo”, disse a jornalistas Dave Bullock, pastor da igreja batista de St. Matthew, em Highland Park, uma cidade da área metropolitana de Detroit.
‘Um rebelde’
A organização Templo Satânico, com matriz em Nova York e representação em vários pontos dos Estados Unidos, reivindica para si Satã, mas não o considera um ser diabólico. Segundo a explicação no site da organização, Satã é entendido pelos membros como “símbolo da natureza inerente do homem, a representação do eterno rebelde, da liberdade individual, mais que uma deidade ou um ser sobrenatural”. Para o grupo, os satanistas devem “trabalhar muito para afiar o pensamento crítico e exercitar o questionamento razoável de todas as coisas”. “A missão do Templo Satânico é encorajar a benevolência e a empatia entre as pessoas. Além disso, abraçamos o sentido comum e o sentido da justiça”. Por isso, eles alegam no website que a escultura é um “chamado às armas com que terá início nossa maior luta em nome da liberdade individual, do livre exercício e contra os teocratas egoístas”. E, em sintonia com estes discurso, a intenção dos organizadores é levar Baphomet ao Estado do Arkansas, cujo governador, o republicano Asa Hutchinson, firmou em abril um projeto de lei que autorizaria a construção de um monumento aos Dez Mandamentos nos terrenos do Congresso do Estado.
Oklahoma O Templo Satânico já havia tentado colocar a escultura em um jardim perto do Congresso do Estado de Oklahoma, perto do obelisco dos Dez Mandamentos, instalado no lugar em 2012 apesar das dúvidas sobre a constitucionalidade do monumento. O obelisco dos Dez Mandamentos é dedicado, como se pode imaginar, ao conjunto de princípios éticos e de adoração que têm um papel importante no judaísmo e cristianismo e foi financiado pelo republicano Mike Ritze, membro da Câmara Baixa do Congresso estadual. Para evitar conflitos relativos à separação da Igreja e do Estado ao colocar tal monumento em uma propriedade pública, o batizaram de parque monumental. Mas agora, depois de anos de polêmica e batalhas legais, no dia 30 de junho a Suprema Corte de Justiça de Oklahoma concluiu que a peça viola a Constituição do Estado que proíbe a utilização de propriedades do governo em benefício de uma religião. Diante disto, vários legisladores estaduais ameaçaram tentar a destituição dos juízes da Suprema Corte de Oklahoma e se comprometeram a apoiar mudanças na Constituição do Estado. A governadora republicana do Estado, Maria Fallin, anunciou que vai manter o monumento no lugar até que o Estado entre com um recurso contra a decisão da Suprema Corte. Enquanto isso, mesmo que Baphomet não tenha sido colocado em lugar público, o Templo Satânico comemorou sua inauguração com gritos “viva Satã”. “É um triunfo artístico único, um testamento da pluralidade e do poder da ação coletiva”, informou o grupo em seu site. Notícia publicada na BBC Brasil , em 27 de julho de 2015.
Claudio Conti* comenta Em se tratando de religião e liberdade religiosa tudo pode acontecer, pois se trata de crenças e, adaptando o ditado popular, “contra crenças não há argumento”. A questão é que existe um grande número de religiões espalhadas pelo mundo afora, cada uma possui seus dogmas, crenças e objetos de devoção. Assim, para ilustrar o que estamos dizendo, vamos falar um pouco do Pastafarianismo. O Pastafarianismo, como é conhecido em português, é a Church of the Flying Spaghetti Monster, que em tradução livre seria “Igreja do Monstro Espaguete Voador”. Muitos podem não acreditar, mas realmente existe esta religião oficialmente, não é apenas um movimento ou algo parecido, sem uma estrutura definida. Como toda religião, apresenta estatuto próprio, deveres, direitos, dirigentes, etc. O objeto de referência para seus adeptos é um escorredor de macarrão na cabeça, usado como um chapéu. As instituições governamentais, tais como aquelas responsáveis pela emissão de documentos de identificação ou carteira de motorista, são obrigadas a aceitar que os seguidores do pastafarianismo usem as fotos no documento com o escorredor na cabeça. A questão principal é que ninguém se importa com um escorredor de macarrão, ninguém se sente agredido ou que sua crença tenha sido ofendida diante de alguém com um escorredor de macarrão ou outro símbolo inócuo qualquer. Porém, a figura de Satã não é inócua para a humanidade ocidental em geral, pois traz forte componente arquetípico e, por isso, a grande maioria não consegue perceber que o objeto de adoração de um grupo ou outra religião, que não aquela que professa, em nada interfere com as suas próprias crenças. Diante de um componente psíquico que foi “ativado” pelo estímulo, no caso a estátua de Satã, toda e qualquer racionalização deixa de ser viável, dando vazão a reações das mais variadas. A estátua relativa aos Dez Mandamentos, por sua vez, incomada alguns, contudo, não da mesma forma e intensidade, pois o componente arquetípico possui outro valor, diferenciado quanto à forma e intensidade, acarretando reações compatíveis. Para aqueles que o incômodo é grande, se sentem impotentes por não haver massa crítica para um movimento antagônico maior. Uma questão que a humanidade precisa ainda aprender é conviver em harmonia. Alguns grupos apresentam seus objetos de adoração, ou sagrados, cada um maior que o outro, em praças públicas, na frente de prédios, templos ou não, à vista de todos, visando atrair adeptos ou demonstração de orgulho, que é a ideia disseminada pelas religiões dominantes, aquelas com maior número de adeptos. Em decorrência da liberdade religiosa, todos devem ter o mesmo direito. É difícil dizer até que ponto os adeptos do Pastafarianismo realmente acreditam num deus espaguete, pois, segundo relatos, o conceito por trás desta religião é uma crítica às religiões dominantes e estruturadas com suas crenças, objetos de devoção e práticas religiosas. Assim, podemos tirar uma valiosa lição: oremos baixo e em reclusão, quando em conjunto, procuremos não ultrapassar o direito do próximo de não o “forçar” a compartilhar, em decorrência de som alto ou larga expansividade, de uma prática religiosa que não lhe atrai. Com frequência os ensinamentos de Jesus são esquecidos dentre os que se dizem cristãos, pois vale lembrar as seguintes palavras de Jesus: “Quando orardes, não vos assemelheis aos hipócritas, que, afetadamente, oram de pé nas sinagogas e nos cantos das ruas para serem vistos pelos homens. - Digo-vos, em verdade, que eles já receberam sua recompensa. - Quando quiserdes orar, entrai para o vosso quarto e, fechada a porta, orai a vosso Pai em secreto; e vosso Pai, que vê o que se passa em secreto, vos dará a recompensa.” O exemplo sempre é o melhor argumento.