7 de junho de 2015
Luz no lixo
O fotógrafo alemão Micha Ende retrata como a vida dos catadores de lixões do Rio de Janeiro se transformou radicalmente após a extinção dos aterros a céu aberto da cidade
por Carlos Turdera
A Política Nacional de Resíduos Sólidos, sancionada em 2010, determina que os aterros a céu aberto não podem mais existir no Brasil. Desde 2 de agosto de 2014, os municípios ficaram obrigados a executar diversas ações ambientalmente responsáveis, como a reciclagem, o reúso, a compostagem, o tratamento e a coleta seletiva dos materiais descartados. O não cumprimento da lei pode acarretar multas de até R$ 50 milhões. Não foram só os lixões os afetados, os catadores também tiveram de se enquadrar na nova realidade.
No Rio de Janeiro, o lixão de Gericinó, em Bangu, é o último ícone daquele modelo de despejo que a lei hoje procura deixar para trás. Embora oficialmente já esteja desativado, seu nome continua a designar um território concreto e simbólico de grande peso para a cidade e para as famílias que tiravam de lá o seu sustento. Dos 246 catadores que foram cadastrados durante o processo de adequação do vazadouro, hoje apenas 85 permanecem vinculados ao novo projeto. Todos eles, mesmo os que não ficaram, receberam uma indenização de R$ 14 mil. Após cursos de qualificação organizados pela Comlurb e a prefeitura, eles se integraram em seis cooperativas.
A temática dos lixões ganhou destaque no cinema com Vik Muniz, autor de uma obra que revalorizou aquilo que até então era descartado sem contemplação: objetos, mas também pessoas. O fotógrafo alemão Micha Ende, radicado no Brasil desde 1985, passou oito meses em Gericinó (de setembro de 2013 até a extinção oficial, em 4 de abril de 2014) para retratar os “caçadores de tesouros”. “Não queria reproduzir o estereótipo depressivo nem estilizar a miséria, mas sim mostrar as pessoas, íntegras”, disse ele a GALILEU. O registro faz parte de seu projeto Vizinhos distantes, que abrange aspectos socioculturais de Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul, os Brics.
Matéria publicada na Revista Galileu , em 19 de fevereiro de 2015.
André Henrique de Siqueira comenta*
— Sim, mas o homem é insaciável. A Natureza traçou limites de suas necessidades na sua organização, mas os vícios alteraram a sua constituição e criaram para ele necessidades artificiais.(1)
Um dos principais problemas da modernidade é o modo de tratar o planeta. Em um interessante estudo em 1993, a pesquisadora Faith Popcorn identifica que nos próximos anos uma das tendências do mercado seria a emergência de uma preocupação com o meio-ambiente. Neste cenário, o lixo seria, ao mesmo tempo, um grave problema e uma excelente oportunidade para negócios.(2)
O lixo possui duas dimensões que devem ser consideradas. O primeiro é que ele é um resíduo de processos de produção ao de consumo e como tal pode vir a ser reciclado. O segundo é que ele pode se tornar um problema contra o meio-ambiente se não for adequadamente tratado.
Um excelente estudo sobre o Espiritismo e a Ecologia pode ser encontrado no trabalho de André Trigueiro. Em resposta a uma entrevista da Folha Espírita, o jornalista carioca, nos traz um excelente material para reflexão:
FE: Qual a responsabilidade do espírita para com o planeta? Trigueiro – O espírita precisa se dar conta de que, quando o planeta adoece, nosso projeto evolutivo fica comprometido. Emmanuel, em O Consolador, diz que o meio ambiente influi no espírito. Aos espíritas que mantém uma atitude comodista diante desse cenário, escorados talvez na premissa determinista de que tudo se resolverá quando se completar a transição da Terra (de mundo de expiações e de provas para o mundo de regeneração), é bom lembrar do que disse Santo Agostinho, no capítulo III, de O Evangelho Segundo o Espiritismo. Ao descrever o mundo de regeneração, Santo Agostinho afirma que, mesmo livre das paixões desordenadas, num clima de calma e repouso, a humanidade ainda estará sujeita às vicissitudes de que não estão isentos senão os seres completamente desmaterializados; há ainda provas a suportar (…) e que ‘nesses mundos, o homem ainda é falível, e o espírito do mal não perdeu, ali, completamente o seu império. Não avançar é recuar e se não está firme no caminho do bem, pode voltar a cair nos mundos de expiação, onde o esperam novas e terríveis provas’. Ou seja, não há mágica no processo evolutivo: nós já somos os construtores do mundo de regeneração.(3)
Allan Kardec, refletindo sobre o necessário e o supérfluo,(1) também nos dá um bom material para reflexão:
— Desconhecem a lei de Deus e terão de responder pelas privações que ocasionarem.
Comentário de Kardec: O limite entre o necessário e o supérfluo nada tem de absoluto. A civilização criou necessidades que não existem no estado de selvageria, e os Espíritos que ditaram esses preceitos não querem que o homem civilizado viva como selvagem. Tudo é relativo e cabe à razão colocar cada coisa em seu lugar. A civilização desenvolve o senso moral e ao mesmo tempo o sentimento de caridade que leva os homens a se apoiarem mutuamente. Os que vivem à custa das privações alheias exploram os benefícios da civilização em proveito próprio; não têm de civilizados mais do que o verniz, como há pessoas que não possuem da religião mais do que a aparência.(1)
Vemos que o problema não é apenas de reciclagem. Enquanto não nos conscientizarmos sobre a importância de corrigir a nossa relação com o Universo, não estaremos prontos para o exercício da cidadania delineada por Jesus, quando nos declarou herdeiros do Reino dos Céus, o qual não é uma utopia religiosa, mas uma necessária adequação de nossas almas às sublimes leis que regem o Universo.
Referências
(1) KARDEC, Allan. O Livro dos Espíritos. Ed. FEB. Rio de Janeiro;
(2) POPCORN, Faith. O Relatório Popcorn: Centenas de Ideias de Novos Produtos, Empreendimentos e Novos Mercados. Rio de Janeiro: Elsevier, 1993;
(3) SANTOS, Cláudia. Ecologia e Espiritismo. On Line. Disponível em , acessado em 10/04/2015.