Dois casais de amigos adotam seis irmãos: “Não queríamos separá-los”
Seis irmãos que estavam para adoção em um abrigo no município de Uruguaiana (RS) realizaram o sonho de não ficarem longe uns dos outros. Eles foram adotados por dois casais amigos que moram em Votorantim (SP) e vivem uma rotina juntos, apesar de morarem em lares separados. A adoção ocorreu há três anos e os seis estudam na mesma escola, vão à mesma igreja e frequentam as respectivas casas.
O casal Cristina dos Santos e Gilson dos Santos foi o primeiro a se interessar pela adoção de três garotos, mas os dois não sabiam que eles tinham mais três irmãs. Os seis estavam temerosos de perder o contato ao serem adotados por famílias diferentes.
Ao descobrirem as outras crianças, Cristina e Gilson se lembraram do casal amigo Bruna Francine Xavier Mantovane e Vinícius Augusto Mantovane, que estava habilitado para adoção, e contaram sobre a história dos seis irmãos. Apesar de viverem na época um luto com a perda de uma filha, os dois também toparam aumentar a família.
Nova história Os meninos foram adotados por Cristina e Gilson e as meninas, por Bruna e Vinícius, em 2019. Na época, as garotas tinham 12, 9 e 7 anos, e os garotos, 13, 11 e 6. Todo processo de adoção durou três anos. Primeiro com a guarda provisória, depois com a guarda definitiva e, finalmente, a adoção, quando todos puderam mudar seus registros de nascimento com os nomes dos pais e dos avós adotivos.
A oficialização da adoção foi um sentimento de alívio para a filha mais velha de Bruna, hoje com 15 anos. “Ela tinha muito medo de não ver mais os irmãos”, conta. Todos os seis foram juntos com os pais adotivos fazer a identidade, um marco de uma nova etapa da vida deles.
Bruna conta, em entrevista a Universa, que logo que se casou com Vinicius descobriu que seria muito difícil eles terem filhos biológicos. “Os exames médicos apontaram que havia poucas chances. Como tínhamos casado há pouco tempo, não pensávamos em ter filhos na época, mas três anos depois decidimos que queríamos”, relata, destacando que o casal não foi em busca de alternativa de tratamento médico e optaram logo pela adoção.
Há tantas crianças já nascidas esperando alguém que as amem. Então por que tentar colocar outras no mundo? A entrega de documentos à Justiça para se habilitarem a serem pais adotivos teve início em 2014. Em 2015, o casal colocou o perfil de filhos que gostariam adotar — duas crianças de até cinco anos — e, em 2016, saiu a habilitação. “No final de 2017 recebemos uma ligação de uma comarca do interior de São Paulo relatando que havia um bebê, com 49 dias, na maternidade. Ela era portadora da síndrome de Down, tinha uma cardiopatia e precisava de cuidados médicos. A nossa primeira filha nasceu para nós com 49 dias e o processo de guarda provisória foi muito rápido por ela ser um bebê.”
Em 13 janeiro de 2018, a filha de Bruna foi submetida a uma cirurgia para corrigir a cardiopatia, chegou a passar quase quatro meses no hospital se recuperando e foi para casa. “Desde o momento que a conhecemos em dezembro de 2017 até fim de fevereiro de 2018 ficamos internados com ela no hospital, foi um pós-cirúrgico longo.”
O bebê tinha quatro meses quando foi para casa. “Foi bem intenso porque fomos pais de primeira viagem, ainda com todas as fragilidades de saúde dela. Porém, devido à cardiopatia, ela acabou falecendo perto dos sete meses de idade. A gente começou um processo muito difícil de luto e os padrinhos da Valentina viveram isso conosco.”
Os padrinhos de Valentina são Cristina e Gilson, que também estavam em processo de adoção. Em dezembro de 2018, o casal recebeu uma ligação da comarca de Uruguaiana dizendo que havia um menino no perfil que o casal procurava. Durante o processo de guarda, Cristina e Gilson descobriram que o menino tinha mais dois irmãos e decidiu adotar os três. Mas a família ainda não tinha sido revelada por completo.
Durante o processo, foi descoberto que eram seis irmãos que estavam para adoção. Os três meninos tinham três irmãs, que ainda estavam abrigadas. Elas estavam correndo risco de serem adotadas por famílias diferentes. Foi quando Bruna e o marido foram avisados da existência das três irmãs.
“Eu e meu esposo estávamos vivendo um processo de luto pela perda da nossa Valentina. E a chegada das meninas nos deu uma nova razão para continuar.”
Naquele momento, os seis irmãos ainda não sabiam se um dia iriam se reencontrar. Os três garotos foram embora do abrigo sem saber que havia um processo de adoção das irmãs. As meninas também estavam tristes com a ida dos irmãos para outro estado.
Bruna e Vinicius decidiram então adotar as meninas e viajaram para Uruguaiana para conhecê-las e fazer o processo de adaptação de dez dias. Apenas depois de as meninas terem aceitado serem adotadas, os pais adotivos contaram que elas iriam morar na mesma cidade que os irmãos e que os pais adotivos deles eram amigos do casal.
“As crianças estão sempre juntas, porque nós, os pais, somos amigos. Eu sempre digo para as meninas que elas não nasceram de nós, mas para nós”, conta Bruna.
A mãe adotiva relata que a família vive em constante processo de adaptação. “Não é nada fácil, pois as meninas vieram com alguns hábitos da família biológica, que aos poucos fomos corrigindo.” Os seis irmãos foram colocados para adoção porque a família biológica é composta por dependentes químicos e acabaram expondo as crianças a situações de risco.
“Emocionalmente vivemos o extremo em tudo: extremo de amor, extremo de dor, extremo de aprendizado. A gente cresceu demais nesse tempo que estamos todos os cinco juntos”, completa.
Notícia publicada na Universa , em 07 de Outubro de 2021
O que leva uma família, um casal, a adotar? Ao falar no assunto, ouvimos tantas coisas: “Melhor adotar um animalzinho de rua, dá menos dor de cabeça”; “A criança já desde pequena mostrou a ascendência ruim que tinha dos pais biológicos… só deu desgosto.”; “pegou pra criar e olha no que deu, até nos pais ele bate”. E por aí vai. Fora quando não se diz que o jovem está “revoltado” porque “a família escondeu” que foi adotado.
Bem antigamente, num resquício da escravidão, famílias “pegavam pra criar” uma criança, mas na verdade era um(a) criado(a) das crianças biológicas da família, chamando os “pais” de padrinho e madrinha e fazendo as tarefas da casa a troco de abrigo, roupas, alimentação e, às vezes, oportunidade de estudo. Verdade que na maioria das vezes, na família biológica essas crianças talvez morressem de fome ou alguma doença, por falta de recursos. Mas isso não é adoção.
A notícia em destaque mostra a adoção verdadeira, onde o coração está acima dos outros quesitos. Avisados de que “havia um menino no perfil que o casal procurava”, o mesmo se deslocou à outra cidade e se inteirou dos sentimentos da criança, de sua situação, suas expectativas e necessidades. Descobriu então serem seis crianças, não uma. Crianças já mais crescidinhas, não bebês que se educa desde o início “do seu jeito”, alguns entrando na adolescência, considerada fase difícil de lidar. E que estas crianças estavam aflitas por se separarem. Claramente sem condições para adotar seis crianças, acionaram um casal que vivia um luto difícil, do bebê que não sobreviverá, e que, também em mais um arroubo de amor, aceitou adotar a outra metade da família, três crianças cada. E ainda entraram em entendimento para mantê-los em contato. Estão em constante adaptação, mas todos estão tentando fazer funcionar.
Os ensinamentos do Espiritismo a respeito da imortalidade do Espírito, das reencarnações, dão uma luz segura do porquê os relacionamentos familiares “dão certo” ou não. As pessoas trazem sua índole pessoal e ainda sua bagagem emocional para o ambiente familiar, independente de ser uma família ligada biologicamente ou não. O Amor, ou sua ausência, o equilíbrio desse Amor na educação, a orientação segura (não possessiva ou complacente), fazem que a família seja ou não esse porto seguro com que todos sonhamos, esse local para onde se pode voltar… por vontade própria, sabendo que será bem recebido.
Muitas pessoas trocam sua família biológica por amigos, exatamente porque não se sentem assim na família de origem, por quaisquer conflitos que possam existir. Por que não fazer o mesmo por uma criança? Por que as críticas que ouvimos a quem o faz? E muitas vezes críticas pesadas, desequilibradas, preconceituosas. Por que será que as pessoas não comentam os casos onde justamente a criança adotiva é que cuidou desses pais na velhice? Há uma música famosa do Sérgio Reis que fala disso.
Em “O Evangelho Segundo o Espíritismo”, os espíritos explicam sobre família espiritual. Na Codificação da Doutrina Espírita, nos livros do espírito André Luiz e outros, aprendemos sobre planejamento reencarnatório, e entendemos que, a nosso pedido mesmo, estamos lado a lado com pessoas com quem temos conflitos, para resolvê-los em amor e convivência, em esforço mútuo.
A legislação brasileira, felizmente, caminhou muito no sentido de facilitar adoções, em especial de bebês e crianças com problemas (mais vulneráveis) e da adoção de filhos dos parceiros, nos casos de segunda união. Há pessoas cujo coração é grande o suficiente para amar crianças nascidas de outros corpos físicos, independente de ter filhos biológicos ou não, e fazer com que todos se sintam acolhidos e amados. E, a essas pessoas, nossa sincera homenagem, admiração e respeito.